De acordo com o 6˚ levantamento da Safra 2021/2022 realizado pela CONAB, a área destinada a produção de grãos no Brasil teve um incremento de 4,3%, atingindo a expressiva marca de 72,7 milhões de hectares. Esse incremento se deu principalmente pelo aumento na área destinada a lavouras de soja e milho. Nas maiores regiões produtoras de grãos do país, essa dupla é cultivada em sucessão, com lavouras de soja no verão (1a safra) e, de milho no outono/inverno (2a safra). Para tanto, é necessário organização e planejamento por parte do produtor para semear a soja com prazo adequado para o desenvolvimento e, realizar a colheita a tempo da semeadura do milho, que é realizada logo na sequência.
Entre as várias vantagens desse sistema, podemos destacar o aumento de produção em uma mesma área e a possibilidade de expansão da cultura do milho para o Centro-Oeste, onde os cultivos são realizados em áreas mais extensas. No entanto, a presença de lavouras durante grande parte do ano propicia condições ideais para sobrevivência e multiplicação de várias espécies de insetos polífagos, que são aqueles que se alimentam de uma variedade de plantas hospedeiras.
Dentre essas espécies, merecem destaque os percevejos, principalmente o percevejo-marrom da soja (Euschistus heros), que corresponde a mais de 90% dos indivíduos encontrados nas diversas regiões produtoras de grão. Além desse, duas espécies de percevejo-barriga-verde (Diceraeus melacanthus e Diceraeus furcatus) também aparecem nessas culturas.
Na soja, os principais danos causados pelas espécies de percevejos são observados nos grãos, com perdas significativas de qualidade e quantidade da produção. As populações tendem a aumentar no final do estágio vegetativo da cultura, atingindo picos populacionais na fase de maturação de grãos. Esse fato agrava a dificuldade do monitoramento, pois os sintomas não são visíveis ao produtor.
Já na cultura do milho, os danos se dão pela alimentação dos percevejos na fase de plântula, sendo os sintomas mais graves causados pelas espécies de percevejo-barriga-verde. Altas populações e falhas de manejo podem levar a perdas de produtividade de grãos da ordem de 60%.
Figura 1. Adulto de percevejo-marrom, Euschistus heros, em soja. Fonte: Fernando Iost
Adultos de percevejo-barriga-verde em milho. Fonte: J. Crosariol Netto.
Em função das características ecológicas dessas espécies de percevejos serem diferentes na cultura da soja e do milho, foi criado um ambiente ideal para a movimentação entre as duas culturas. Ou seja, se altas populações de percevejos na fase final da lavoura de soja não forem manejadas de maneira adequada, esses indivíduos poderão se manter nos restos culturais, ou até mesmo em plantas daninhas, e começarem a se alimentar nas plântulas de milho recém-emergidas. Apesar do ataque ocorrer já na fase de plântula, os sintomas do ataque de percevejo-barriga-verde em milho podem ser observados mais tarde quando a planta se desenvolve e as folhas desenrolam, surgindo perfurações sem formato definido e com halos amarelos ao redor (causados por toxinas injetadas no momento da alimentação), sendo bem distintas de perfurações de lagartas que também podem ocorrer nas plântulas, mas deixam marcas arredondadas e sem halos amarelos ao redor.
Figura 2. Sintoma de ataque a plântulas de milho por percevejo barriga-verde (esquerda) e lagartas (direita), visíveis em folhas desenvolvidas. Fonte: Dirceu Gassen.
Além dos percevejos, existem pragas de solo que podem ser encontradas em lavouras de soja e milho. Os corós, por exemplo, são larvas de besouros que habitam a parte radicular das culturas e podem estar presentes na área, atacando tanto a lavoura de soja, quanto a lavoura de milho da sequência. Ainda, espécies de pragas iniciais que, geralmente, causam danos às plântulas acontecem nas duas culturas, à exemplo da lagarta-rosca e da lagarta-elasmo.
Um outro grupo de pragas que é reportado se movimentando entre as lavouras de soja e milho são as lagartas desfolhadoras. A movimentação, na verdade, acontece durante a fase adulta da praga, as mariposas. No entanto, na sucessão soja-milho, as lagartas presentes na fase final da lavoura de soja podem se abrigar nos restos culturais e plantas daninhas, atingir a fase de pupa e, posteriormente, dar origem a mariposas que irão colocar seus ovos no milho. As principais espécies de lagartas que podem ocorrer nesse sistema são a lagarta-do-cartucho, Spodoptera frugiperda, e as lagartas do gênero Helicoverpa, principalmente Helicoverpa armigera e Helicoverpa zea. Em soja, essas espécies podem ocorrer na fase inicial da cultura, cortando plântulas e, nas fases mais avançadas da lavoura, se alimentando tanto de folhas, quanto de estruturas reprodutivas como flores e vagens. Por esse motivo, é comum que as populações aumentem na fase reprodutiva da cultura.
Figura 3. Lagarta Helicoverpa armigera em milho. Fonte: EMBRAPA
Figura 3. Lagarta Helicoverpa armigera em soja. Fonte: EMBRAPA
Em milho, S. frugiperda é considerada a principal praga, podendo atacar desde plântulas até espigas, ao passo que Helicoverpa zea tem preferência por se alimentar nas espigas.
Figura 4. Danos da lagarta-do-cartucho, Spodoptera frugiperda, em milho. Fonte: Fernando Iost.
Por fim, podemos citar ainda a presença de mosca-branca, Bemisia tabaci, muito comum na soja e que passou a ser reportada em milho. Dessa maneira, vale reforçar que se tratando de pragas com grande movimentação entre as lavouras que são levadas ao campo em sucessão, o manejo deve ser direcionado ao sistema e não somente à lavoura que está no campo em determinado momento. O monitoramento deve ser constante e o registro das informações coletadas deve ser realizado de forma a direcionar estratégias de controle futuras. Ferramentas como tratamento de sementes, controle químico e controle biológico devem ser utilizadas de maneira integrada, visando a máxima eficiência no controle. Ainda, o controle cultural deve ser considerado, por meio de técnicas simples, porém muito importantes, como controle de plantas daninhas e plantas voluntárias (tigueras) que servem como abrigo para essas pragas que habitam o sistema de produção soja-milho.
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